O rebanho da barriga vazia
Alheios à polêmica sobre uso político do Cheque-Cidadão entre católicos e evangélicos, famintos avançam sobre restos na Ceasa
Na corrida contra a fome, os famintos largaram na frente. Sem respostas concretas das autoridades para obter comida, eles voltaram ontem a catar restos de alimentos nos escombros do pavilhão incendiado da Ceasa. Uma atitude desesperada para quem já não tem mais a quem apelar. O Cheque-Cidadão, solução de refeição na mesa para muitos, foi suspenso em meio à crise financeira do estado e à polêmica aberta por autoridades da Igreja Católica e representantes de denominações evangélicas sobre uso político do benefício.
No restante do estado, o mapa da fome aumenta. O Programa Crescer, que atende dez mil crianças na Baixada Fluminense, está abandonado. Para quem não tem o que comer, pouco importa de onde o auxílio vem. O fundamental é que chegue. “Sem o Cheque-Cidadão, a gente acaba passando fome mesmo”, resumiu o desempregado Jorge Cabral de Araújo, um dos 60 mil cadastrados no Cheque-Cidadão que ainda não recebeu os R$ 100 fundamentais para a sobrevivência de sua família. O benefício, de acordo com o governo, só deve voltar a ser pago mês que vem, após recadastramento das famílias e distribuidores.
Os argumentos usados pelo cardeal-arcebispo do Rio, Dom Eusébio Oscar Scheid, segunda-feira, para justificar o abandono de fiéis do catolicismo rumo a “seitas banais” foram recebidos com protesto no meio evangélico. Segundo o religioso católico, a debandada seria estimulada por instituições que usam programas sociais, como o Cheque-Cidadão – conduzido pelo governo estadual –, para ganhar a adesão dos beneficiados.
“O arcebispo reclama de barriga cheia. O que ele queria na verdade, era exclusividade na distribuição. Falta à Igreja Católica democracia”, atacou o bispo Rodrigues, da Igreja Universal.
O secretário estadual de Desenvolvimento Social, Fernando William, quer encontrar Dom Eusébio. “Mostrarei que não há privilégios para nenhuma instituição religiosa fazer a distribuição da verba”, garantiu.
Em Brasília, autoridades responsáveis pela implantação do Programa Fome Zero se reuniram e confirmaram que as primeiras ações serão anunciadas dia 30. Foram firmadas parcerias com entidades que reúnem prefeituras para dar maior agilidade à distribuição de alimentos. O programa começará pelo semi-árido nordestino: Guaribas e Acauã, no Piauí, serão os primeiros dos 959 municípios contemplados com a ajuda até dezembro.
janeiro 23, 2003
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